sexta-feira, 16 de julho de 2010

Dor e sofrimento


Estamos lá, achando que a vida é perfeita, que tudo é alegria, sucesso, vencer desafios, atingir metas. Traçamos o plano e ele está sendo seguido à risca, tudo se encaixa, tudo está saindo como queríamos.


E, de repente, tudo desaba.

Um detalhe inesperado acontece. Nunca previsto, não estamos preparados. Não sabemos o que fazer e tudo fica confuso. A vida colorida passa a ser em preto e branco; a trilha sonora da nossa vida passa a tocar músicas tristes e reflexivas.

Surge a dor, exteriorização do sofrimento que estamos sentindo em nossa alma.

E tudo vira desencanto.

Acordar é doloroso. Mal nos damos conta de quem somos e já vem aquele "frio na barriga" e aquela dor no peito, em algum lugar que não sabemos precisar, porque não é bem no corpo.

Dormir passaria a ser um bom refúgio, se não fossem os pesadelos que nos afligem, nos deixando em situações hipotéticas em que nos encontramos mais impotentes diante de tudo aquilo do que quando acordados.

Pronto, a vida não é feita só de alegrias e felicidades. Descobrimos.

Tudo fica confuso, mas, no fundo, sabemos que alternativas clássicas existem. Ou enfrentamos, ou nos desesperamos, ou desistimos e aceitamos.

E nem sempre há solução para um problema. E aí o enfrentar acaba se desdobrando na solução desistir e aceitar.

Há aquelas fórmulas de quem já passou ou pensou sobre isso, como o modelo de Kübler-Ross, que trata dos cinco estágios pelos quais passam as pessoas que lidam com a perda, o luto ou a tragédia: (1) a negação e o isolamento ("Isso não pode estar acontecendo."), (2) a raiva ("Por que eu? Não é justo.") (3) a negociação ("Vamos achar um meio-termo."), (4) a depressão ("Tudo é uma droga mesmo. Desisto.") e (5) a aceitação ("Tudo vai ficar bem.").

Mas o fato é que perdemos a fé em tudo e em todos. Tendemos a nos isolar mesmo, a nos retrair.

Por que aquilo aconteceu se somos tão bonzinhos, não fazemos mal a ninguém? O que fizemos? Por que comigo?

E isso é um momento pelo qual quase todo mundo passa ou vai passar. Algumas pessoas talvez não, pode ser que só tenham alguns pequenos problemas e que podem ser resolvidos com a disciplina e esforço. Mas muitas pessoas passam por esses momentos de intensa dor no fundo do seu ser.

E aí chegamos naquela dúvida: só procuramos Deus quando estamos bem e esquecemos Dele na hora da crise ou o negamos enquanto estamos bem e só lembramos Dele na hora grave?

Algumas pessoas pensam que Deus não existe e isso piora o problema, pois não há onde buscar conforto.

Algumas pessoas se desesperam e chegam a tirar suas vidas.

Outras morrem por dentro, mesmo que apenas parcialmente.

A maioria gostaria que a vida fosse um filme em que podemos voltar atrás e mudar as coisas para ter um final feliz.

Mas, como disse Chaplin, a vida não permite ensaios. E nem podemos retroceder a "cena". O que está feito, está feito. Gravado para sempre na história de nossa vida. Só podemos mudar daqui em diante e, mesmo assim, algumas coisas não podem ser mudadas.

Isso é o que torna a vida tão singular, pois, ao que parece, não temos garantia de nada e, de repente, tudo pode mudar sem nosso mínimo controle.

Pode ser lugar comum, mas quando isso aconteceu em minha vida não enxerguei outra opção senão buscar consolo nas palavras que Jesus nos deixou nos Evangelhos. Me pareceu que algo errado eu fiz, pois Deus é justo e ninguém sofre por acaso. O que me restou? Buscar mudar o que eu pude e aceitar o que não me foi possível, passando a atentar mais para os meus erros até então ocultos, valorizando um comportamento mais correto, justo, caridoso com as outras pessoas, pois se eu sofro muitas outras pessoas podem estar sofrendo também e eu não me preocupava muito com isso.

Então, a dor e o sofrimento nos tornam mais humanos, mais conscientes. Às vezes, a dor serve para nos despertar de um "estado automático" em que estávamos e nem sabíamos. Se for encarada como uma possibilidade de aperfeiçoamento, a dor pode educar, engrandecer nossa alma e nos fazer ter mais fé em Deus, pois Ele não permite nada para o nosso mal, mesmo quando necessitamos de uma corrigenda ou outra.

A vida é aprendizado e evolução. Algumas vezes podemos aprender pelo amor, outras pela dor. Se não atentamos para os detalhes, a dor vai nos mostrar onde precisamos melhorar.

Mesmo se houver uma perda importante, que parece sem razão, uma tragédia sem sentido, aquilo não é punição alguma, só um fato a ser vivenciado, aprendido, talvez até mesmo para aprendermos a valorizar mais a convivência com as pessoas. Deus sabe o que é melhor para nós; não duvidemos disso.

Nessas horas, o ateu sofre mais. Vai precisar de um refúgio na caridade alheia, pois não acredita que as coisas estão em ordem e que há um Criador que controla cada milímetro do Universo.

Mesmo se Deus não existisse, o que digo apenas para argumentar, ainda assim eu preferiria acreditar que Ele existe e que eu devo ser melhor do que sou, devo ser uma pessoa melhor ao lidar com os meus semelhantes e com todos os seres que habitam o mundo. Porque, se no final Deus não existir e nem houver vida após a vida, pelo menos eu terei sido uma pessoa melhor do que eu podia ser se não acreditasse em Deus.

E essa fé em que as coisas estão em equilíbrio nos ajuda a passar pelas "pedras" do caminho, a vencer a dor e a aprender com ela, nos tornando pessoas melhores.

É certo que, se fosse possível escolher, ninguém ia querer aprender através da dor. Mas às vezes é só o que nos resta.

Jesus disse: "Bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados. – Bem-aventurados os famintos e os sequiosos de justiça, pois que serão saciados. – Bem-aventurados os que sofrem perseguição pela justiça, pois que é deles o reino dos céus." (S. MATEUS, 5:4, 6 e 10.).

Sabia Ele que o sofrimento acaba conduzindo a um estado melhor. Através dele o ser vai se "lapidando", caminhando para a perfeição.

Se a dor nos atingir, saibamos enfrentá-la e aprender com ela. É sinal de que algo não vai bem e precisamos aprender algo mais. Aceitemos com fé em Deus e no Nosso Mestre Jesus e aprendamos a lição, lutando para vencermos o desânimo e a revolta e para vencermos o desafio que nossa vida nos impõe, muitas vezes por nossa própria escolha.

Deus não abandona seus filhos. Não sofreremos mais do que podemos aguentar e nem menos do que a lição reclama.

E saibamos lutar para vencer a dor e a dificuldade, não nos entregando à passividade e à aceitação quando a vida reclama nossos esforços. Enfrentar um sofrimento não quer dizer aceitar sem lutar pelo melhor possível. Aceitar quer dizer compreender que há coisas que não poderemos mudar. Mas devemos melhorar e mudar aquilo que estiver ao nosso alcance, pois certamente Nosso Pai não quer ver seus filhos passíveis, sem lutar pela felicidade alcançável, aquela que só depende do esforço de cada um.

Não pensemos que ser Cristão e Espírita é aceitar tudo sem "luta". Não é. Devemos trabalhar e batalhar por nossa felicidade onde estivermos. Aquilo que não pudermos mudar através do nosso esforço deve ser aceito como um fato consolidado de aprendizado necessário. Mas o resto reclama nossa luta, nosso trabalho para melhorar, evoluir e aprender. A ordem da vida é o amor, mas também é o trabalho e o esforço de cada ser.

Confiando em Deus, seguindo o que Jesus nos ensinou, aceitando os acontecimentos que não podemos mudar e lutando para vencer cada dificuldade que se nos apresenta em nossas vidas, alcançaremos, um dia, um estágio evolutivo, mais próximos de Deus, em que só aprenderemos através do amor e do trabalho, sem o "remédio amargo" da dor.

Um comentário:

  1. Muito obrigada pelas palavras em ótima hora!
    Estou passando por dor, mas estou diminuindo a cada dia o sofrimento.
    Adriana

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